Quando a Solidão é a Regra: A Dor Silenciosa das Famílias Atípicas e a Falta de Rede de Apoio

Quando a Solidão é a Regra: A Dor Silenciosa das Famílias Atípicas e a Falta de Rede de Apoio

Julho 17, 2025 0 Por Redação

 

 

Por Aderlan Angelo Camargo – Delegado de Polícia e Autista

Uma das maiores dores que acompanham o diagnóstico do autismo não está no laudo em si, mas no silêncio que se instala ao redor da família. Pais e mães de crianças autistas, já sobrecarregados pelas exigências terapêuticas, pelas incertezas do futuro e pelo impacto emocional do diagnóstico, muitas vezes se veem desamparados. O que deveria ser um momento de união se transforma, para muitos, numa jornada solitária.

Falo com conhecimento de causa. Desde 2016 praticamente minha família vive distante de seus familiares mais próximos. E, como pai de uma criança autista e também autista, experimentei na pele o peso dessa ausência. A rotina profissional, as demandas domésticas e o cuidado contínuo com nosso filho não deixaram espaço para descanso. E o que torna tudo ainda mais difícil é constatar que muitas vezes o distanciamento não é apenas físico, mas também emocional. Parentes se afastam. Amigos se calam. E o que sobra é o cansaço — físico e emocional.

A ausência de uma rede de apoio é uma realidade comum a muitas famílias atípicas. Quando não há condições financeiras para contratar cuidadores, terapeutas ou assistentes, o peso recai exclusivamente sobre os pais. E ainda que ambos trabalhem, como é o caso da maioria das famílias brasileiras, não há como delegar o cansaço, nem como terceirizar o cuidado.

No entanto, essa não é apenas uma questão privada. É uma questão social, institucional e política. A rede de apoio que falta não se resume ao círculo familiar: faltam políticas públicas efetivas, programas comunitários de acolhimento e incentivo ao voluntariado. A empatia precisa sair do discurso e se traduzir em ações concretas.

Como Delegado de Polícia, observo diariamente como a ausência de apoio e acolhimento leva ao adoecimento psíquico, à desestruturação familiar e, em muitos casos, à marginalização. Muitas mães, especialmente, enfrentam sozinhas uma carga insustentável. Precisamos, enquanto sociedade, repensar nossa estrutura de cuidado. E isso passa por educação, por conscientização, mas também por compromisso institucional.

Não há diagnóstico que machuque mais do que o abandono. Por isso, é urgente que a empatia se materialize: seja por meio de uma escuta atenta, de um tempo voluntário, ou do simples gesto de oferecer companhia a quem enfrenta uma tempestade em silêncio. Famílias atípicas não precisam de piedade — precisam de presença. Precisam de redes. Precisam saber que não estão sós.

Aderlan Angelo Camargo – Delegado de Polícia e Autista